Sabrina Alves
Gabriel Furtado
Os relatos aqui citados concernem às ações dos
bolsistas na primeira oficina, realizada no IFG Campus Aparecida de Goiânia. Em
consenso foram utilizados os conceitos principais de "Cidadania",
"Periferia" e "Gênero", abordados ao longo da execução da
oficina e aprofundados no ensino dos discentes e sua relação com o
documentário.
Por se tratar de um tema recorrente no cotidiano
dos alunos, optamos por tratá-lo, no caso específico do conceito de gênero, a
partir de relatos de mulheres consideradas de periferia. Situadas também em
Aparecida de Goiânia, o documentário "Mulheres da Terra" mostra de
maneira breve o cotidiano de mulheres habitantes do bairro "Terra
Prometida". Por entendimento de todos que participaram da construção dessa
oficina, o documentário compactua e se relaciona diretamente com a problemática
posta para nortear a discussão dentro desse trabalho, isto é, ela enaltece o
lugar da mulher na construção da dinâmica do cotidiano da cidade.
Cidadania e Periferia:
Cidadania e Periferia:
A construção histórica do
conceito de cidadania e gênero se deu a partir do próprio cotidiano dos alunos.
Contudo, o início da oficina constituiu na apresentação expositiva do conceito
aos discentes. Foi importante elencar que a sociedade brasileira no início do
século XX demonstrava que o exercício da cidadania por homens e mulheres se
diferia, tanto na atuação política como em papeis sociais. As lutas femininas
ao longo das décadas demonstraram que a diferença de fato afeta a vivência das
mulheres, e há uma distinção do tratamento dos gêneros que causa insatisfação e
desarmonia no cotidiano social. Todos esses motivos elencaram lutas e
movimentos sociais a favor de uma maior equidade no tratamento dos gêneros. O
que procuramos mostrar é que análise social também pode ser presenciada na
própria cidade dos alunos e que essa realidade não está distante deles. Por
isso, pedimos para que fizessem uma entrevista com alguma mulher, orientados
pelas problematizações que fizemos na oficina no intuito de identificar as
diferenças nas concepções e vivências acerca da cidadania entre os gêneros.
A questão da periferia foi tratada inicialmente com
uma pergunta dirigida aos alunos: "Quem se considera de periferia?".
No primeiro instante os alunos se abstiveram ao se considerar de periferia.
Logo depois houve uma gradativa aceitação pelo estado de morador de periferia,
visto que a maioria morava próximo ao campus ou dentro de aparecida, as mãos
começaram a se levantar. Tentamos criar uma situação de identificação do
discente para com a região que o mesmo vive. Visto que, periferia dá o sentido
de disparidade do centro, uma separação entre rico e pobre. A maioria se
identificou como morador de periferia.
As atividades cumpriram de certa forma a
identificação da problemática proposta. As mulheres entrevistadas passaram por
diversos problemas elencados durante a exposição dos conceitos e do
documentário, de certa maneira houve uma identificação de um lugar em comum das
mulheres. A falta do exercício de cidadania e disparidade de salários e
tratamento dentro do ambiente de ofício foi um apontamento em comum nas
entrevistas.
Por isso, observa-se que o trabalho dos bolsistas
na construção da problemática foi favorável a incitar no alunado as
problemáticas presentes no meio acadêmico e que afetam o cotidiano dos
discentes. Todavia, o que mais se releva nessa experiência é a presença e a
participação ativa dos alunos, tanto na oficina como no incentivo à nossa
própria prática como docente. A relação de aprendizagem é e sempre foi uma via
de mão dupla, ambos os lados foram desenvolvidos e acrescidos. Foi uma
experiência rica e repleta de aprendizado.
Gênero: considerações gerais sobre o processo
elaborativo, debate, história e formação docente
Quando iniciamos os preparativos para a elaboração
do plano para a realização das oficinas nos deparamos com o primeiro tema que
abordava a questão das relações de gênero, algo tão importante de ser tratado e
que está posto no cotidiano das relações, mas que embora fizesse parte de nosso
dia-a-dia, ainda não tínhamos a profundidade das discussões de pesquisas que
abordaram o assunto. Ou seja, o saber inicial vinha das experiências de sermos
sujeitos inseridos em um meio social, onde os conflitos estão estabelecidos e
no qual as relações de poder são permeadas por idéias que subjugam pessoas e
estabelecem desigualdade de direitos baseadas em supostas determinações de
nascença.
Então, começamos a refletir sobre as questões
que estavam postas e que envolviam as relações de gênero e logo percebemos que
dentro da pluralidade das demandas, às das mulheres se destacavam em razão de
terem trazido o conflito à tona, expondo aquilo que está no interior das casas,
do trabalho, nas escolas, nas ruas, no atendimento de saúde, enfim evidenciando
a tudo o que toca as suas realidades, principalmente no contexto do século XXI.
Assim, encontramos um documentário cuja temática eram as mulheres que
trabalhavam, criavam seus filhos, moradoras da periferia e provedoras do
sustento de seus lares, com afetos e também com histórias de desafetos, mas que
eram mulheres que existem no cotidiano das cidades deste país e com as quais
muitas outras se identificam ao se depararem com suas trajetórias de vida.
Deste modo, Mulheres da Terra (2013) nos
davam possibilidades de pensar como as relações se davam no interior da
sociedade, diante de uma construção da binaridade de gênero que diferencia e
impõe lugares para àquelas pessoas que se reconhecem como mulheres e homens.
Assim, estávamos diante de um desafio. Munidos com o arcabouço adquirido no
processo de planejamento, enfrentamos as barreiras impostas pelo
constrangimento inicial e buscamos ser mediadoras e mediadores, desta questão
sensível, por meio da História.
Logo, propusemos que se refletisse sobre se gênero
era uma construção social ou não, perguntando a razão de uma pessoa na infância
ganhar uma boneca e outra um carinho, ou o motivo pelo qual uma usa rosa e
outra azul. Na instigação inicial notamos nas respostas que as justificativas
eram de base biológica e religiosa, com raras opiniões em se colocasse como uma
construção. Era como algo determinado, ou você é mulher ou homem, pela
genitália e forma física e que embora de maneira não clara definia os lugares
sociais.
Por conseguinte, quando chegamos aos grupos de
debate que foram formados entre as alunas e alunos, com a mediação das e dos
bolsistas, a problemática da construção histórica do conceito se impunha, então
diferenciar sexualidade e identidade de gênero era fundamental para se chegar a
reflexão da construção dos lugares sociais e também para incorporar outras
questões que envolviam a cidadania e periferia. O debate no grupo em ficaram
Sabrina, Gabriel e Thaysa, as/os estudantes foram instigados a opinarem sobre a
exposição inicial articulando com o documentário, em sua maioria as opiniões
diziam a respeito às experiências que tinham em suas famílias e nos lugares de
seu cotidiano, como a escola.
O que surpreendeu foi o fato de que no grupo, não
homogêneo quanto a identificação de gênero, as maiores manifestações de
reflexão foram dos discentes que se identificavam como o gênero masculino. Mas,
ainda, expressavam uma concepção de lugar para as mulheres que naturalizava e
não estabelecia conflito, com exceção de duas opiniões que se baseavam a
vivência de uma menina e de um menino lgbt (ambos se identificavam desta forma
respectivamente). Nas duas opiniões se expressavam contrárias a concepção de
essência masculina ou feminina, embora identificassem que socialmente era tida
como inata. E a medida, em que foram falando outros também se colocaram, não em
posição de enfrentamento, mas acrescentando informações. Essa interação
possibilitou que se questionassem a razão pela qual se discutir nesta
temporalidade sobre gênero, as respostas se deram no âmbito de haver uma
abertura de espaço diante da pluralidade.
Essa abertura, segundo a opinião discente, teria
sido permitida em razão das mulheres estarem ocupando lugares aos quais antes
não tinham acesso, e quando percebiam as mulheres no documentário que eram mães
e não tinham um companheiro as viam como independentes e mesmo naquelas que
tinham companheiros percebiam o desejo de que as filhas tivessem os destinos
profissionais diferente dos seus.
Por fim, uma concepção de que há uma dinâmica
histórica que coloca questões ao corpo da sociedade em épocas distintas e que
isso afeta as relações foi evidenciada na construção em grupo, embora não
havido tempo para prosseguir com o aprofundamento desta noção para
problematizar a fundo a questão da constituição dos lugares sociais a partir do
conceito de gênero.
De todo modo, o fato de se ter apreendido que
existe, de uma temporalidade para outra, mudanças foi importante, pois se
constituiu em uma chave interpretativa por meio da qual as e os estudantes,
puderam realizar as atividades que exigiam uma articulação entre os conceitos e
a dinâmica das mudanças geracionais, com a finalidade de se constituir um saber
histórico diante do partilhamento de experiências das mulheres que foram
entrevistadas pelas e pelos discentes.
Diante do exposto, a compreensão de que é na
interação que forma a identidade docente é basilar. À medida que respeitar e
ouvir as opiniões discentes, entendendo que estas são pessoas que trazem
consigo práticas, costumes que falam de seus lugares e produzem saberes,
fortalecem a concepção de uma educação inclusiva e rompe com uma estrutura que
promove a exclusão ao estabelecer mecanismos que distinguem as pessoas e
perpetuam desigualdades que se fundam em visões de mundo que concebem a
discriminação como algo natural. Incluir é estimular à empatia, afetos, a construção
de conhecimento através do compartilhamento em prol de uma sociedade na qual
haja igualdade de direitos e condições.
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