domingo, 6 de agosto de 2017

Relato de experiência sobre a oficina: "História, Cidadania e Gênero"

Sabrina Alves

Gabriel Furtado



Os relatos aqui citados concernem às ações dos bolsistas na primeira oficina, realizada no IFG Campus Aparecida de Goiânia. Em consenso foram utilizados os conceitos principais de "Cidadania", "Periferia" e "Gênero", abordados ao longo da execução da oficina e aprofundados no ensino dos discentes e sua relação com o documentário. 
Por se tratar de um tema recorrente no cotidiano dos alunos, optamos por tratá-lo, no caso específico do conceito de gênero, a partir de relatos de mulheres consideradas de periferia. Situadas também em Aparecida de Goiânia, o documentário "Mulheres da Terra" mostra de maneira breve o cotidiano de mulheres habitantes do bairro "Terra Prometida". Por entendimento de todos que participaram da construção dessa oficina, o documentário compactua e se relaciona diretamente com a problemática posta para nortear a discussão dentro desse trabalho, isto é, ela enaltece o lugar da mulher na construção da dinâmica do cotidiano da cidade.



Cidadania e Periferia:

     A construção histórica do conceito de cidadania e gênero se deu a partir do próprio cotidiano dos alunos. Contudo, o início da oficina constituiu na apresentação expositiva do conceito aos discentes. Foi importante elencar que a sociedade brasileira no início do século XX demonstrava que o exercício da cidadania por homens e mulheres se diferia, tanto na atuação política como em papeis sociais. As lutas femininas ao longo das décadas demonstraram que a diferença de fato afeta a vivência das mulheres, e há uma distinção do tratamento dos gêneros que causa insatisfação e desarmonia no cotidiano social. Todos esses motivos elencaram lutas e movimentos sociais a favor de uma maior equidade no tratamento dos gêneros. O que procuramos mostrar é que análise social também pode ser presenciada na própria cidade dos alunos e que essa realidade não está distante deles. Por isso, pedimos para que fizessem uma entrevista com alguma mulher, orientados pelas problematizações que fizemos na oficina no intuito de identificar as diferenças nas concepções e vivências acerca da cidadania entre os gêneros.
A questão da periferia foi tratada inicialmente com uma pergunta dirigida aos alunos: "Quem se considera de periferia?". No primeiro instante os alunos se abstiveram ao se considerar de periferia. Logo depois houve uma gradativa aceitação pelo estado de morador de periferia, visto que a maioria morava próximo ao campus ou dentro de aparecida, as mãos começaram a se levantar. Tentamos criar uma situação de identificação do discente para com a região que o mesmo vive. Visto que, periferia dá o sentido de disparidade do centro, uma separação entre rico e pobre. A maioria se identificou como morador de periferia.
As atividades cumpriram de certa forma a identificação da problemática proposta. As mulheres entrevistadas passaram por diversos problemas elencados durante a exposição dos conceitos e do documentário, de certa maneira houve uma identificação de um lugar em comum das mulheres. A falta do exercício de cidadania e disparidade de salários e tratamento dentro do ambiente de ofício foi um apontamento em comum nas entrevistas.
Por isso, observa-se que o trabalho dos bolsistas na construção da problemática foi favorável a incitar no alunado as problemáticas presentes no meio acadêmico e que afetam o cotidiano dos discentes. Todavia, o que mais se releva nessa experiência é a presença e a participação ativa dos alunos, tanto na oficina como no incentivo à nossa própria prática como docente. A relação de aprendizagem é e sempre foi uma via de mão dupla, ambos os lados foram desenvolvidos e acrescidos. Foi uma experiência rica e repleta de aprendizado.
Gênero: considerações gerais sobre o processo elaborativo, debate, história e formação docente
Quando iniciamos os preparativos para a elaboração do plano para a realização das oficinas nos deparamos com o primeiro tema que abordava a questão das relações de gênero, algo tão importante de ser tratado e que está posto no cotidiano das relações, mas que embora fizesse parte de nosso dia-a-dia, ainda não tínhamos a profundidade das discussões de pesquisas que abordaram o assunto. Ou seja, o saber inicial vinha das experiências de sermos sujeitos inseridos em um meio social, onde os conflitos estão estabelecidos e no qual as relações de poder são permeadas por idéias que subjugam pessoas e estabelecem desigualdade de direitos baseadas em supostas determinações de nascença.
 Então, começamos a refletir sobre as questões que estavam postas e que envolviam as relações de gênero e logo percebemos que dentro da pluralidade das demandas, às das mulheres se destacavam em razão de terem trazido o conflito à tona, expondo aquilo que está no interior das casas, do trabalho, nas escolas, nas ruas, no atendimento de saúde, enfim evidenciando a tudo o que toca as suas realidades, principalmente no contexto do século XXI. Assim, encontramos um documentário cuja temática eram as mulheres que trabalhavam, criavam seus filhos, moradoras da periferia e provedoras do sustento de seus lares, com afetos e também com histórias de desafetos, mas que eram mulheres que existem no cotidiano das cidades deste país e com as quais muitas outras se identificam ao se depararem com suas trajetórias de vida.
Deste modo, Mulheres da Terra (2013) nos davam possibilidades de pensar como as relações se davam no interior da sociedade, diante de uma construção da binaridade de gênero que diferencia e impõe lugares para àquelas pessoas que se reconhecem como mulheres e homens. Assim, estávamos diante de um desafio. Munidos com o arcabouço adquirido no processo de planejamento, enfrentamos as barreiras impostas pelo constrangimento inicial e buscamos ser mediadoras e mediadores, desta questão sensível, por meio da História.
Logo, propusemos que se refletisse sobre se gênero era uma construção social ou não, perguntando a razão de uma pessoa na infância ganhar uma boneca e outra um carinho, ou o motivo pelo qual uma usa rosa e outra azul. Na instigação inicial notamos nas respostas que as justificativas eram de base biológica e religiosa, com raras opiniões em se colocasse como uma construção. Era como algo determinado, ou você é mulher ou homem, pela genitália e forma física e que embora de maneira não clara definia os lugares sociais.
Por conseguinte, quando chegamos aos grupos de debate que foram formados entre as alunas e alunos, com a mediação das e dos bolsistas, a problemática da construção histórica do conceito se impunha, então diferenciar sexualidade e identidade de gênero era fundamental para se chegar a reflexão da construção dos lugares sociais e também para incorporar outras questões que envolviam a cidadania e periferia. O debate no grupo em ficaram Sabrina, Gabriel e Thaysa, as/os estudantes foram instigados a opinarem sobre a exposição inicial articulando com o documentário, em sua maioria as opiniões diziam a respeito às experiências que tinham em suas famílias e nos lugares de seu cotidiano, como a escola.
O que surpreendeu foi o fato de que no grupo, não homogêneo quanto a identificação de gênero, as maiores manifestações de reflexão foram dos discentes que se identificavam como o gênero masculino. Mas, ainda, expressavam uma concepção de lugar para as mulheres que naturalizava e não estabelecia conflito, com exceção de duas opiniões que se baseavam a vivência de uma menina e de um menino lgbt (ambos se identificavam desta forma respectivamente). Nas duas opiniões se expressavam contrárias a concepção de essência masculina ou feminina, embora identificassem que socialmente era tida como inata. E a medida, em que foram falando outros também se colocaram, não em posição de enfrentamento, mas acrescentando informações. Essa interação possibilitou que se questionassem a razão pela qual se discutir nesta temporalidade sobre gênero, as respostas se deram no âmbito de haver uma abertura de espaço diante da pluralidade.
Essa abertura, segundo a opinião discente, teria sido permitida em razão das mulheres estarem ocupando lugares aos quais antes não tinham acesso, e quando percebiam as mulheres no documentário que eram mães e não tinham um companheiro as viam como independentes e mesmo naquelas que tinham companheiros percebiam o desejo de que as filhas tivessem os destinos profissionais diferente dos seus.
Por fim, uma concepção de que há uma dinâmica histórica que coloca questões ao corpo da sociedade em épocas distintas e que isso afeta as relações foi evidenciada na construção em grupo, embora não havido tempo para prosseguir com o aprofundamento desta noção para problematizar a fundo a questão da constituição dos lugares sociais a partir do conceito de gênero.
De todo modo, o fato de se ter apreendido que existe, de uma temporalidade para outra, mudanças foi importante, pois se constituiu em uma chave interpretativa por meio da qual as e os estudantes, puderam realizar as atividades que exigiam uma articulação entre os conceitos e a dinâmica das mudanças geracionais, com a finalidade de se constituir um saber histórico diante do partilhamento de experiências das mulheres que foram entrevistadas pelas e pelos discentes.     
Diante do exposto, a compreensão de que é na interação que forma a identidade docente é basilar. À medida que respeitar e ouvir as opiniões discentes, entendendo que estas são pessoas que trazem consigo práticas, costumes que falam de seus lugares e produzem saberes, fortalecem a concepção de uma educação inclusiva e rompe com uma estrutura que promove a exclusão ao estabelecer mecanismos que distinguem as pessoas e perpetuam desigualdades que se fundam em visões de mundo que concebem a discriminação como algo natural. Incluir é estimular à empatia, afetos, a construção de conhecimento através do compartilhamento em prol de uma sociedade na qual haja igualdade de direitos e condições.  

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